sábado, 12 de outubro de 2013

Instituto de Accção "Social" das Forças Armadas...

Um desabafo de um Almirante reformado, com quase 90 anos de idade:

  Atendendo à minha idade e à lei da vida, candidatara-me, pela 2ª vez, a residencial de idosos do CASOeiras do IASFA.

  Informaram-me agora terem alojamento disponível. Mensalidade 1953 euros! Teve substancial aumento este verão, segundo me informaram.
  Esse montante é superior à pensão líquida que estou recebendo. E ela vai ainda baixar, por força do corte de 10% que o Governo já propôs à Assembleia da República, por força do aumento da contribuição que estou fazendo para o próprio IASFA, por força do que consta irá vir no OE2014.
  E tenho outros compromissos que não posso cancelar.
  Impossível eu pagar tal mensalidade.
  Em fim de vida, com relevantes serviços prestados a Portugal, com prejuízo do apoio que qualquer cidadão pode e deve dar à sua família, com os riscos que corri, com o que a lei de bases da condição militar estabelece, afinal que espécie de apoio me dá o Instituto de Acção Social das Forças Armadas?   "

domingo, 22 de setembro de 2013

Portugal europeu - e agora ?

Decorreu há uma semana o Encontro em epígrafe, em que perante mais de mil participantes foram debatidos diversos aspectos decorrentes da participação de Portugal na União Europeia, em sessões animadas por pessoas de reconhecido mérito, conforme se pode constatar na respectiva agenda.

Porém terá faltado na agenda, segundo penso, uma relevante questão: existe um "espírito europeu" susceptível de ser a base de uma União de Estados da Europa ?

É certo que houve uma sessão sectorial, em que se discutiu se haveria uma cultura europeia, porém numa óptica diferente da que deveria decorrer da análise da existência de uma identidade transnacional, pelo que salvo intervenções pontuais de uma assistência que curiosamente era muito maioritariamente composta por pessoas de idade aparentemente inferior a 50 anos se falou de uma União à luz dos parâmetros que a têm vindo a sustentar, e não se abordou adequadamente o que pode caracterizar a existência de um pensamento comum sobre uma união europeia.

Pensada tal união na perspectiva de se obterem condições que evitassem conflitos sangrentos como os que abalaram a Europa nos últimos séculos, terá faltado a procura de pontos comuns que permitissem a evolução de afirmações de exclusão do que não seria desejado - o conflito militar - para o que poderiam ser pontos comuns de acordo sobre o que deveria ser procurado - a identidade cultural possível, e o decorrente projecto comum.

Esta procura, necessariamente ajustada à constatação das mutações induzidas pelas fortes migrações de raiz islâmica, bem como às que ocorreram e ocorrem a partir de Estados situados nas periferias leste e sul, deveria levar à redefinição dos actuais Tratados, assentes então em princípios que não deixarão de reconhecer que uma união europeia só muito lentamente poderá evoluir de uma concertação de Estados em que é relevante o primado da economia para se transformar, através da livre circulação de pessoas e da troca de ideias que só os sistemas democráticos são capazes de proporcionar, numa união política de povos e nações.

União política que nas condições actuais não pode deixar de ter apenas a ambição de evoluir gradualmente e de evitar fracturas que ponham em causa o sentimento de uma identidade europeia entretanto reencontrada e aperfeiçoada.

22.Setembro.2013.

domingo, 15 de setembro de 2013

Candidaturas saltitantes (a presidentes de Câmara).

Foi conhecida há poucos dias a decisão do Tribunal Constitucional que permite que um ex-Presidente de Câmara Municipal se candidate, após três mandatos consecutivos numa autarquia, a idênticas funções numa outra análoga.

Creio que terá sido esquecida não só pelo Tribunal como também pela grande maioria dos cidadãos que o espírito da Constituição aponta para que os candidatos aos órgãos de uma autarquia tenham residido e continuem a residir na respectiva área, se bem que a lei eleitoral não o indique expressamente por, ao que julgo saber, se recear que em muitos casos de pequenas freguesias não existissem candidatos em número suficiente.

Porém, o espírito da lei e do senso comum aponta precisamente no sentido da vinculação de candidaturas à residência no território eleitoral respectivo, pois doutro modo e por exemplo um cidadão romeno poderia apresentar-se à eleição em Portugal mesmo que a sua residência habitual fosse no seu país de naturalidade, apenas sendo necessário que estivesse inscrito no recenseamento eleitoral, tal como os mandatários, e não necessariamente na área de candidatura, onde apenas estes ultimos teriam que residir...

Por outro lado, e como é expresso na mesma lei eleitoral, acresce que os proponentes da candidatura devem fazer prova de estarem recenseados na área eleitoral em causa - como é lógico

Poderia dizer-se que em muitos casos não haveria candidatos residentes, mas com a recente redução do número de pequenas freguesias tal possibilidade terá ficado mais limitada, acrescendo que a lei prevê que na inexistência de candidaturas seja o órgão executivo assegurado por uma comissão administrativa provisória nomeada pelo Governo, sendo por outro lado muito pouco provável que tais inexistências ocorressem ao nível dos municípios.

Tribunal Constitucional e opinião pública terão, creio, caído na armadilha de se concentrarem apenas numa perspectiva da Constituição, esquecendo o fundo do problema: a essência do Poder local.

E assim temos agora que lidar com a existência de uma nova classe nas classificações de emprego: presidente de Câmara Municipal e presidente de Junta de Freguesia, que percorrerão o país oferecendo os seus préstimos.

Talvez um dia o Parlamento acorde e pense nestas questões...

15.Setembro.2013.

domingo, 8 de setembro de 2013

PIDE, jornalismo, e História.

Segundo veio a público na imprensa, o jornalista José Milhazes irá apresentar em breve um livro em que se refere aos arquivos da "PIDE-DGS" no qual entre outras afirmações "conta ainda o episódio vivido por um agente soviético, Guenrikh Borovik, que, passando por jornalista, em Maio de 1974, entra com "facilidade" na sede da PIDE em Lisboa, na companhia de um português, tendo "roubado" o próprio cartão de identidade de Silva Pais, o director da então polícia política, apesar de ter sido revistado pelos militares do Movimento das Forças Armadas que guardavam o edifício.".

É assim oportuno mencionar que nos arquivos do Centro de Documentação 25 de Abril (Universidade de Coimbra) consta no "Espólio 111" a existência do "Bilhete de Identidade de Silva Pais, director da PIDE/DGS", conforme se pode verificar a partir daqui.

Não se pode exigir a um jornalista que seja um historiador, porém os textos que publica são objecto de análise por historiadores credenciados, que por certo não deixam de os comparar com outras fontes.

Porém, uma vez publicados em livro, entram no circuito de referências bibliográficas, pelo que acontece com frequência que o contraditório só surja noutro livro muito tempo depois, situação que leva a que se forme no imaginário colectivo uma ideia que não corresponde plenamente à verdade, a qual, quando se torna pública, já ocorre em momento tardio demais para se corrigirem totalmente erros de natureza histórica.

A Internet permite que se faça uma correcção mais imediata e susceptível de aferição por entidades apropriadas, que no caso presente não deixariam por certo de verificar se o alegado cartão de identidade de Silva Pais não seria por exemplo o de associado de uma eventual associação desportiva dos funcionários da polícia política...

Fica assim registada, por este meio, a dissonância entre dois testemunhos que mostram a diferença entre o imaginário e a realidade.

A palavra aos historiadores.

8.Setembro.2013

domingo, 1 de setembro de 2013

Eleições, e Poder Local.

É inconcebível que a menos de um mês das eleições para os órgãos das autarquias ainda não tenham sido publicadas as novas leis reguladoras das atribuições e competências respectivas, bem como dos respectivos regimes financeiros.

Não é possível que os candidatos possam preparar seriamente as suas campanhas e apresentar-se  às eleições tomando apenas como base os textos dos documentos aprovados na Assembleia da República há apenas um mês.

Tais textos demonstram aliás que pouco se avançou na transferência de poderes a partir das Assembleias e Câmaras Municipais numa perspectiva de reforço das atribuições e competências das Assembleias e Juntas de Freguesia, não tendo sido certamente por acaso que uma das Propostas de Lei iniciais mencionava no seu título a expressão "regime jurídico" para depois na versão final vir a ser substituída por "regime financeiro".

Parente pobre do sistema democrático, as Freguesias continuam longe de ser a essência do Poder Local, que mais do que nunca em momentos de crise como os que se vivem deveria ser a base de um democracia que está longe de se realizar plenamente na mera representação eleitoral, relegando para plano secundário a participação de base - a que é essencial na construção democrática.

A poucos meses do quadragésimo aniversário da queda do "Estado Novo", sombrios presságios decorrem de eleições que serão por certo pouco concorridas, e de uma complexa situação financeira envolvendo a elaboração de um Orçamento sem se terem dados fundamentados que permitam saber como se obterão adequados financiamentos de Estado para o segundo semestre de 2014.

01.Setembro.2013.

domingo, 25 de agosto de 2013

Razões para uma abstenção.


    Faltam cinco semanas para a realização das eleições para as autarquias locais, e poucos dias para que seja conhecida a decisão do Tribunal Constitucional sobre a admissibilidade de apresentação de candidaturas de cidadãos que exerceram funções de presidência de Câmaras Municipais ou de Juntas de Freguesia durante os três últimos exercícios numa mesma autarquia.
    A grande maioria dos Deputados deixou que se arrastasse o problema da citada admissibilidade, decorrente de uma lei obviamente mal redigida pois deu origem a diversas interpretações judiciais, não só ao nível de primeira instância com também ao de Relação, tendo que se aguardar até agora por uma decisão que respeita não apenas a alguns mas sim a muitos casos, com todo o desprestígio para o processo eleitoral decorrente deste arrastamento.
    Por outro lado, e como já o referi nestas páginas, o "Memorando de entendimento" sobre o programa de assistência financeira à República Portuguesa deu origem a um processo de agregação de freguesias que, aprovado por maioria parlamentar,  levou a que por exemplo algumas que abarcavam 20 mil eleitores fossem forçadas a uniões da ordem dos 50 mil - mais do que os existentes em muitos municípios.
    Foi assim consumada mais uma agressão ao Poder Local, base sem a qual a Democracia deixa de ser um processo de verdadeira participação política privilegiando o mero sistema representativo, tão criticado - até pela generalidade dos cidadãos com responsabilidades políticas - por manter os eleitos afastados dos eleitores.
    Não tenho assim alternativa para um escolha consciente de quem me pudesse representar ao nível de Assembleia de Freguesia, pois não me é possível em poucos dias conhecer candidatos oriundos de zonas mais afastadas, bem como os programas com que se apresentem.
    O voto em branco seria uma possibilidade, mas corresponderia, no meu entender, à aceitação de um modelo que pelas razões que aduzi considero ser uma violentação da essência da democracia, e por outro lado corresponderia a avalizar indirectamente o triste espectáculo que o Parlamento nos ofereceu (sob o olhar complacente do Presidente da República) não só no caso das citadas agregações de freguesias mas também quanto ao processo que aguarda decisão no Tribunal Constitucional.
    É assim que com pena alguém que colaborou na organização das eleições de 1976 não encontra - pela primeira vez - alternativa eleitoral que não seja a da abstenção.
25.Agosto.2013.

domingo, 18 de agosto de 2013

Sobre o Washington Post.


A compra do lendário Washington Post pelo criador e principal accionista da Amazon (J.Bezos) vem criar largas expectativas sobre o futuro dos jornais em suporte papel, pois parece ser o primeiro caso de aquisições deste tipo, dado que até agora se assistia quer à duplicação dos jornais clássicos passando a existir também em formato digital, quer ao seu simples desaparecimento.

A sobrevivência da Amazon enquanto fornecedora de livros "clássicos", se bem que ajudada pela sua expansão ao sistema de vendas de outros produtos com entregas por vias tradicionais, e a sua entrada no mercado das aquisições de livros e outros documentos em formato digital, sobrevivendo bem à concorrência da Google e de outras companhias, faz antever que J.Bezos pense numa nova fórmula que possibilite uma união "papel-digital" susceptível de permitir a sobrevivência dos clássicos jornais num mundo em que a informação corre cada vez mais célere e diversificada.

Parece assim provável que o Washington Post evolua para um modelo dual, em que a informação muito recente apareça na versão digital acompanhada de ligações para documentos e comentários que permitam uma melhor compreensão dos acontecimentos, sempre privilegiando contribuições audio-visuais de alta credibilidade obtidas aquando do respectivo evento; e em que na versão em papel, distribuída de modo que por certo surpreenderá pela imaginação e versatilidade, surgirão análises e debates de maior profundidade.

Em qualquer dos casos, o valor das iniciativas de J.Bezos estará dependente do modo como conseguirá manter o jornalismo tradicional enquanto mediador credível da informação, tanto na versão em suporte papel como na digital.

Num mundo em que se assiste à atomização da informação circulante, que nos avassala em termos quase demolidores, importa cada vez mais dispormos de recursos para nos ajudar a ponderar sobre a credibilidade do que chega ao nosso alcance, bem como a comparar pontos de vista.

Oxalá J.Bezos consiga contribuir para se encontrarem soluções para este tipo de problemas, mantendo a possibilidade de folhearmos um jornal como ocorre com os livros, em que tal perspectiva está por natureza aliada à capacidade de calmamente reflectirmos sobre o que lemos.

18.08.2013.