Alguns comentários a "Pontos de vista" de Luís Costa Correia.
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- Sobre o "Ponto de vista - Maio de 1968, Fevereiro de 1968" :
Do Comandante Sousa e Silva (13.Dez.2008):
" Foi com agradável surpresa que numa das minhas primeiras "navegações" pela NET (sou recém convertido) deparei com o teu "site" que, com o maior prazer, li de ponta a ponta.
Desde logo reparei na magnífica estruturação e em todos os pormenores que sempre foram teu timbre.
Depois passei ao conteúdo : indiscutível a oportunidade, clareza e objectividade dos "pontos de vista" - curtos, acutilantes, não controversos.
Deparei-me então com um que publicaste em 11.Maio.2008 cujo título é "Maio de 1968, Fevereiro de 1968".
E aqui, com o único objectivo de tornar o texto coincidente com os factos, obrigas-me a avivar-te a memória.
O "movimento" no Clube Militar Naval (CMN) começou em finais de 1967 quando, terminada mais uma reunião da Comissão de Redacção dos Anais, a que nós pertencíamos, nos sentámos num banco do "mezzanine" e tu disparaste : "vou deixar de ser sócio do CMN porque só sou sócio de associações que sirvam para alguma coisa e o CMN não serve para nada". Após um breve silêncio, eu respondi que estava nas nossas mãos fazer com que o CMN servisse para alguma coisa.
Dali partimos para um dos nossos habituais jantares na "Trindade" onde começámos a esboçar uma qualquer intervenção no CMN.
Lembro-me de ter referido que "é preciso agitar a malta para o que faz falta". A maioria dos sócios do CMN era constituída por jóvens oficiais que, como nós, também não gostavam do Clube como estava ... às moscas. Acrescentei que, no princípio do ano, ia haver a habitual assembleia geral para eleição dos novos Corpos Gerentes e que nós poderíamos utilizar sem necessidade de alterar o curso normal das coisas. E lembrei-te que as mais recentes assembleias do CMN tinham tido a maior dificuldade em conseguir quorum (12 sócios !).
Conhecedor dos estatutos do CMN, sugeri que fizéssemos uma intervenção nessa assembleia apresentando um requerimento, antes da Ordem de Trabalhos, no sentido de que o acto eleitoral fosse adiado .para dar tempo a que a Direcção informasse os sócios, por escrito, sobre a situação do Clube e para que as possíveis listas concorrentes apresentássem os seus "Planos de Acção" - para podermos escolher "Programas" em vez de escolher pessoas.
Comungaste imediatamente da idéia e, desde logo, introduziste a componente operacional - lembro-me bem de teres aludido à mancha de óleo que cai no meio de um lago e que, em círculos sucessivos, chega até à margem.
De imediato puxaste de papel e lápis (muito pequeninos, como de costume) e foste escrevendo os nomes dos camaradas que, numa primeira fase, seriam contactados por ti e por mim.
E assim partimos para uma primeira reunião com os seguintes : Homem de Gouveia, Sá Vaz, Chagas Torre, Teixeira Gomes, Pessoa Lopes, João Novais, Nelson Trindade, Zé Silva Dias, Amaro de Oliveira, Carneiro Vieira, Barreto de Albuquerque, Alves de Jesus e Queiróz e Lima.
Estando todos de acordo, voltámos a reunir mais tarde acrescentando os seguintes : Balcão Reis, Oliveira Rego, Ribeiro Reis, Almada Contreiras, Carmo Silva, Silveira Pinheiro, Américo Silva Santos, Sales Grade e os cadetes Coral Costa e Raúl Pita.
Daqui partimos para um "requerimento" a apresentar à assembleia geral que, depois de analisado e discutido por todos os presentes, foi aprovado por unanimidade (consta dos meus arquivos pessoais em manuscrito de três folhas formato A4).
Nesta altura dos acontecimentos ainda não havia notícia de qualquer candidatura.
Até que ...saíu-nos o euromilhões ... a Direcção do CMN (então composta por .médicos que não eram conhecedores da realidade do Clube) apresentou a candidatura do Almirante Tenreiro para presidente do Clube! !
Eis que o "nosso movimento" ganhou uma força imparável.
Aliás, é da mais elementar justiça lembrar que, uns anos antes, já tinha havido no CMN um movimento de rejeição ao Almirante Tenreiro protagonizado, entre outros, pelo Cte. Cyrne de Castro (por quem nutro especial simpatia).
Com todo o cuidado, preparámos as nossas intervenções na assembleia e ensaiámos uma autêntica peça de teatro. Um, que não interessava quem, apresentava o "requerimento", outros pugnavam pelo cumprimento dos Estatutos durante a assembleia, outros defendiam o "requerimento" e outros ainda (dá vontade de rir) atacavam o "requerimento" .
É claro, como não podia deixar de ser, a assembleia foi um êxito !...
E, a partir daí, o CMN mudou...até hoje...
E tu não deixaste de ser sócio...
Ad latere...
Mais tarde fui interpelado por alguns camaradas (por quem tenho a maior consideração) que nos acusavam (a nós os dois) de não termos assumido o poder do CMN.
Expliquei várias vezes que a nossa postura era liberal e que apenas quisemos despertar consciências - era, de resto, o que eu fazia com os meus alunos na Escola Naval (em termos extra-curriculares, para sabatinas que eles me convidavam): "estudem, leiam livros de todas as ideologias - já temos muitos na biblioteca da Escola (tantos que mandei vir do Brasil!...) e assumam ser de direita ou ser de esquerda, mas assumam, e, nunca deixem de respeitar os que pensarem diferente, desde que estejam convictos das suas idéias. E, no final, sempre repetia "o que eu estou a fazer está na linha da tradição da Marinha que é e sempre foi liberal!...".
- Como autor da presente página, não quero deixar de referir que o anteriormente referido pelo distinto Comandante Sousa e Silva evoca momentos dos quais me deveria recordar melhor - mas o passado nunca conseguiu estar bem presente na minha memória.
Lembro-me bem, contudo, de ter surgido da nossa conversa inicial a ideia de um projecto de intervenção na vida do CMN, bem como do cuidado posto na preparação do decorrer da Assembleia Geral convocada para a eleição dos Corpos Gerentes.
É um contributo muito importante para a História, este que o Comandante Sousa e Silva assina, na medida em que o CMN ocupou a partir de então um lugar decisivo no esclarecimento das consciências, tendo sido palco de acontecimentos que vieram a ter influência significativa no golpe de estado ocorrido em Abril de 1974.
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- Sobre o programa "Prós e Contras" na RTP1 (4.Dez.2006)
Do Comandante Roberto Robles, em 5.Dez.2006:
Caro Comandante
Muito oportuno o comentário aos PRÓS E CONTRAS.
Acrescentarei o seguinte:
- Afinal os tão apregoados ESPIRITO DE CORPO e VALORES ÉTICOS, com os quais sempre me identifiquei, são descartáveis quando está em jogo a corrida para a substituição dos chefes militares. Foram termos chamados à liça no dito programa, para classificar de «pouco éticas» as atitudes públicas de alguns militares, na sua esmagadora maioria reservistas ou reformados, portanto na pleneitude dos seus direitos cívicos. Do meu modesto ponto de vista, comete-se um erro na análise dos pressupostos:
Os meus 10 anos de passagem por áreas do recrutamento e selecção na Marinha ( Escola de Alunos Marinheiros, Repartição de Recrutamento e Selecção e Escola Naval) transmitiram-me a opinião bem realista que, os jovens que procuram as Forças Armadas, não virão à procura do "apelo do mar" ou "abraçar a vida militar", hierárquicos defendem eficazmente os seus interesses pessoais e profissionais.
O referido programa, mesmo com uma plêiade de participantes pouco diversificada, provou que alguns destes pressupostos não encaixam com a realidade, daí advindo um natural descontentamento e necessidade de defender os seus interesses nos limites da legalidade, imposta pelo tal "contrato de trabalho" e muito menos pelos omnipresentes valores éticos. E, a meu ver, é com esta nova realidade que os clássicos comentadores politico-militares têm de trabalhar!
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